30.5.09

E eu que amo poesia e nem sabia...

Tô começando a acreditar em reencarnação só para na próxima vida nascer poeta.
*
Tu Queres Sono: Despede-te dos Ruídos
Ana Cristina Cardoso
*
Tu queres sono: despe-te dos ruídos, e
dos restos do dia, tira da tua boca
o punhal e o trânsito, sombras de
teus gritos, e roupas, choros, cordas e
também as faces que assomam sobre a
tua sonora forma de dar, e os outros corpos
que se deitam e se pisam, e as moscas
que sobrevoam o cadáver do teu pai, e a dor (não ouças)
se prepara para carpir tua vigília, e os cantos que
esqueceram teus braços e tantos movimentos
que perdem teus silêncios, o os ventos altos
que não dormem, que te olham da janela
e em tua porta penetram como loucos
pois nada te abandona nem tu ao sono.

20.5.09

Permanecerei com os braços sobre a mesa, a mão esquerda brincando de girar dados num movimento de rotação sobre o eixo-da-própria-mão, os dados que formarão a pulseira-moderninha-comprada-em-feira-artesanal e por isso nem repararei que a água servida poderá virar, em pouco tempo, caso não parasse de olhar para fora, água em estado gasoso. Ou, para brincar com as metáforas, um oceano incolor para o limão displicentemente ajeitado contra o copo e o vidro do copo displicentemente quieto em minha mão, que será apenas uma ponte para o pulso e o pulso, só mais um pedaço para os dados, que ainda girarão, lembrando um predestinar de acaso/sorte. E tudo isso acontecerá em um café no meio da cidade, e na metade do dia, dia que decidirei jogar, ao mesmo tempo que decidirei acender ou não um incenso, afinal, terei a certeza, um tanto cuidadosa é bem verdade, que fará bem o novo-jeito-certo gastar minutos. Sempre tão cheios e grandes e tão fartos, transbordantes de vida, os segundos dos atrasos.
E claro, será pelo teu atraso que irei treinar essa apostazinha (de mim para comigo, entende?), enquanto libélulas escorrerão pelos meus ouvidos e mariposas brincarão em minha cintura, já que não estarei, como se deve, a beber a água, e sim a fazer o (des)acordo com o destino.
Engraçado é que mal importará o dia da semana, ou do mês, ou a luz firme do sol que furará a calçada, pois estarei com os braços sobre a mesa e a mão direita gorará os dados da pulseira do pulso direito enquanto proclamarei para o céu da boca (e ele fará a promessa flutuar no vácuo) que se o dado do lado direito parar e no parar um ponto apenas lhe esconder a face, levantarei e deixarei trocados no pires escuros, mas se o dado do lado esquerdo parar no seis, deverei esperar mais um alento. A grande aposta, e então todos os meus esforços e a minha cegueira me farão apertar os olhos, será para a combinação ímpar, que poderei contar em voz alta embalando as mariposas que sacudirão em meu estômago. Um mais um, ou seis mais seis, ou assim e sempre assim, duas mesmas faces tão semelhantes mas por serem dados distintos, tão diferentes. Será, então, sorte.
*
- Desculpa, demorei.
*
Sempre achei um tanto engraçada a mania histérica das pessoas de pedirem desculpas pelos atrasos, mas nem por isso parecerá a palavra importuna, apenas comentarei qualquer amenidade sobre o caos e será tudo para que não perceba que, num certo exagero, no mesmo instante que seu passo atravessar urgente a porta, largarei os dados e eles voltarão a ser apenas mais um componente de plástico no meu pulso, que será apenas só mais um pulso que servirá de pilar para meu corpo que erguerá da cadeira. E na mesa ainda estará a garrafa, e ainda estará o cigarro que jamias foi aceso, e será o mesmo café-bar de todos os minutos de antes, mas será também nova a conjectura sem foco que inundará o ambiente. E a rua. E todas as coisas em sua volta, como se alguém elevasse a velocidade do mundo, e tudo revelará um jeito novo da vida passar por esses segundos, sempre tão curtos, rápidos e fugidíos. Esses minutos que antecedem os instantes antes do nosso instante. E saberei, poderei ser (pre)destinada e uma cigarra cantará ao meu ouvido, que isso tudo será, somente, a maneira do destino lembrar. Como se fosse um desses bloquinhos de notas com cola na ponta. Desses brancos que saimos colando por cadernos e monitores, e estará claro que no minuto anterior rolei dois dados ansiando uma afirmação, e por euforia, quando pararam não olhei para nenhum deles.
*
Em um prontorrepentemente, tudo voltará a ser apenas aquilo que sempre foi, ou seja, a manhã de mais um dia acontecerá como todos esperam que aconteça as manhãs dos dias, e seremos cotidianas, um quadro já pintado de duas pessoas sentadas em mesas pouco claras, que pedirão líquídos para gelar uma manhã clara ao excesso.
*
Sobre humano será o meu esforço de não planejar o futuro, mantendo a conversa em um só saber de presente. E gravarei na memória a impressão de lanternas, luz amarela, inquietas, lúmens, assim parecerão os teus olhos, enquanto evitarei qualquer eufemismo. Guardarei, pois, em uma ala com capa de couro, e estará entre todas as outras boas recordações, um quem sabe de uma manhã, um desejar de outro dia ou outro. E desejarei, muito quietinha, que entre pulsos e elásticos, os dados fossem ímpares. De um em um.

15.5.09

Se cerro os olhos, curvo os braços
e logo te encontro, no abraço que viaja daqui para aí
E no vôo, curtindo a viagem,
segue doido de vontade
um beijo que, voluptuoso,
Salta delicioso dos meus lábios
quando chamo por ti.

Pela madrugada.

A maneira que acordo, costas grudadas no colchão, olhos grudados em teu ventre que sobe e desce enquanto você sonha. Respira e inspira, uma pequena porção de você para o alto, para baixo, respira... inspira, pequeniníssima porção de você marola-de-alto-mar. O elástico da calcinha acompanha o movimento como faz uma corda que segura o barco no cais e balança prevendo a tempestade. A penugem ao redor do umbigo eriça querendo chegar ao topo.

*

Acordo de uma maneira, costas grudadas no colchão, olhos ardendo a olhar teu colo, enquanto, perto de mim, você dorme – os olhos gostam de encontrar o teu ventre. Inspira e respira, teu quadril é outra menor porção de você a dar formas e curvas ao lençol, inspira... respira, seus lábios entreabrem e permitem que um suspiro pule e vá ser náufrago pelo queixo.

*

Maneira de acordar, costas grudadas no colchão – espuma é sempre seca– apóio a cabeça em uma das mãos, cotovelo enterrado no travesseiro que guarda o sonho da noite que se foi . Olhos de lado vigiam teus mamilos, vindo... indo pela passarela entre o um e o outro seio uteu. Os olhos se agradam do que encontram, os olhos se agradam do calor da tua perna que encosta na minha perna e os olhos se agradam do calor do teu joelho que mexe até colar calor em mim. Você é muito quente e para cima e para baixo inspira e respira. Você é muito quente e tão rija quanto o colchão às minhas costas, e para baixo e para cima você respira e inspira. Seu quadril mexe no ritmo do sinfonia que vibra dentro de você enquanto meus olhos deságuam em tua calcinha – o elástico da tua calcinha é a corda que mantém o barco no cais, meus olhos desatam o nó para te inundar ao reconhecer como íntimo o suspiro que você deixa cair entre nossos travesseiro.

*

Acordei e desgrudei as costas do colchão porque meus olhos se agradam dos poros da tua pele. Mais perto deles querem permanecer, mais perto até que minha respiração viaje e deite os pelos do teu braço, uma brisa que lhe irá deitar os pelos quando minha boca te tocar. Os olhos acham bela a cor que é a cor que tens quase dentro deles. Para lhe imprimir eterna, junto meus olhos abertos em teu ombro, as pálpebras contraem com o toque, pois sabem que agora tu permanecerá para sempre em todos os meus horizontes.

*

Meus olhos sempre brilham e se agradam do que encontram, principalmente quando encontram os seus.

*

Tu acordou e me olha. Na fria e colorida manhã, você me olha e sue sorriso me chama pra acordar contigo.

6.5.09

Anotações sobre um amor urbano.

Para Fá, porque a distância pode parecer uma cruz. Mas a gente faz dela uma delícia.

Num instante soube que brilhavas. Não o brilho dado às estrelas, brilhantíssimas e impossíveis de se enxergar. Numa noite soube que iluminavas um par de horas em minha vida, assim como a lua trata de acender a madrugada na terra, e porque nessa noite soube que tu me iluminavas lanterneira, passei a te desejar com aquele tipo de desejo dos que se aventuram pelo universo: tonta em busca da tua atmosfera, sem medo do vazio absurdo de não ter onde tocar e do estrondoso silêncio que é navegar pelo teu universo, suspirei de certeza, e é engraçado porque mesmo antes da certeza, parecia eu já saber, que enquanto for noite, e enquanto tu fores estrela em minha janela, continuarei acariciando o desejo de contornar o infinito em tua pele, e com a língua, multiplicá-lo mil vezes dentro de mim.
Eu tenho ainda aquela desnecessidade amorosa de evidenciar amor, mas posso repetir baixinho pra ti e só pra ti: vem que eu te amo!

Retornemos.
Pensando bem, meus longos silêncios talvez se deem (e esse acento caiu?!) porque desisti da ideia (esse eu sei que caiu) de comunicar na internet que sou feliz. Ou que não sou. Acho que sou capaz de fazer mais que isto. Diria que nasci para soluçar Caio F. ou vomitar um ou dois coelhinhos cortazianos - quando as bananas e maçãs permitirem ou quando tomates não gritarem feito loucos porque deixei seu bombom cair e bem, vocês sabem o que pode acontecer se o bombom dos tomates cair. Deixarei esse clichê para quem não tem nada mais interessante para fazer/dizer. Ou para quem não consegue escrever de outro modo, afinal, não posso exigir que t.o.d.o.s. saibam narrar direitinho, né? E se isso é antipático, bom, não sou simpática.